Tuesday, September 23, 2008

O Paradoxo do Nosso Tempo

Nós bebemos demais, fumamos demais, gastamos sem critérios, dirigimos rápido demais, ficamos acordados até muito mais tarde, acordamos muito cansados, lemos muito pouco, assistimos TV demais e rezamos raramente. Multiplicamos nossos bens, mas reduzimos nossos valores.

Nós falamos demais, amamos raramente, odiamos freqüentemente. Aprendemos a sobreviver, mas não a viver; adicionamos anos à nossa vida e não vida aos nossos anos. Fomos e voltamos à Lua, mas temos dificuldade em cruzar a rua e encontrar um novo vizinho. Conquistamos o espaço, mas não o nosso próprio.


Fizemos muitas coisas maiores, mas pouquíssimas melhores. Limpamos o ar, mas poluímos a alma; dominamos o átomo, mas não nosso preconceito; escrevemos mais, mas aprendemos menos; planejamos mais, mas realizamos menos. Aprendemos a nos apressar e não, a esperar.


Construímos mais computadores para armazenar mais informação, produzir mais cópias do que nunca, mas nos comunicamos menos. Estamos na era do ‘fast-food’ e da digestão lenta; do homem grande de caráter pequeno; lucros acentuados e relações vazias.Essa é a era de dois empregos, vários divórcios, casas chiques e lares despedaçados. Essa é a era das viagens rápidas, fraldas e moral descartáveis, das rapidinhas, dos cérebros ocos e das pílulas ‘mágicas’. Um momento de muita coisa na vitrine e muito pouco na despensa. Uma era que leva essa carta a você, e uma era que te permite dividir essa reflexão ou simplesmente clicar ‘delete’.


Lembre-se de passar tempo com as pessoas que ama, pois elas não estarão por aqui para sempre. Lembre-se dar um abraço carinhoso num amigo, pois não lhe custa um centavo sequer. Lembre-se de dizer ‘eu teamo’ à sua companheira (o) e às pessoas que ama, mas, em primeiro lugar, ame… Ame muito.


Um beijo e um abraço curam a dor, quando vêm de lá de dentro. O segredo da vida não é ter tudo que você quer, mas AMAR tudo que você tem! Por isso, valorize o que você tem e as pessoas que estão ao seu lado.

Monday, September 22, 2008

Sunday, September 21, 2008

LIXO - CRONICA DE LUIS FERNANDO VERISSIMO





Encontram-se na área de serviço. Cada um com seu pacote de lixo. É a primeira vez que se falam.

_ Bom dia...

_Bom dia.

_ A senhora é do 610.

_ E o senhor é do 612.

_ É.

_ Eu ainda não lhe conhecia pessoalmente...

_ Pois é...

_ Desculpe a minha indiscrição, mas tenho visto o seu lixo...

_ O meu quê?

_ O seu lixo.

_ Ah...

_ Reparei que nunca é muito. Sua família deve se pequena...

_ Na verdade sou só eu.

_ Mmmmm. Notei também que o senhor usa muita comida em lata.

_ É que eu tenho que fazer minha própria comida. E como não sei cozinhar...

_ Entendo.

_ A senhora também...

_ Me chame de você

_ Você também perdoe a minha indiscrição, mas também tenho visto alguns restos de comida em seu lixo, champignons, coisas assim...

_ É que eu gosto muito de cozinhar. Fazer pratos diferentes. Mas, como moro sozinha, às vezes sobra...

_ A senhora... Você não tem família.

_ Tenho , mas não aqui.

_ No Espírito Santo.

_ Como é que você sabe?

_ Vejo uns envelopes no seu lixo. Do Espírito santo.

_ É. Mamãe escreve todas as semanas.

_ Ela é professora?

_ Isso é incrível? Como foi que você adivinhou?

_ Pela letra no envelope. Achei que fosse letra de professora.

_ O senhor não recebe muitas cartas. A julgar pelo seu lixo.

_ Pois é...

_ No outro dia tinha um envelope de telegrama amassado.

_ É.

_ Más notícias?

_ Meu pai. Morreu.

_ Sinto muito.

_ Ele já estava bem velhinho. Lá no sul. Há tempos não nos víamos.

_ Foi por isso que você começou a fumar?

_ Como é que você sabe?

_ De um dia para o outro começaram a aparecera catreiras de cigarros amassadas no seu lixo.

_ É verdade. Mas consegui parar outra vez.

_ Eu, nunca fumei.

_ Eu sei. Mas tenho visto uns vidrinhos de comprimidos no seu lixo...

_ Tranqüilizantes. foi uma fase. Já passou.

_ Você brigou com o namorado, certo?

_ Isso você também descobriu no lixo?

_ Primeiro o buquê de flores, com o cartãozinho, jogado fora. Depois, muito lenço de papel.

_ É, chorei bastante, mas já passou.

_ Mas hoje ainda têm uns lencinhos...

_ É que estou comum pouco de coriza.

_ Ah.

_ Vejo muitas revistas de palavras cruzadas no seu lixo.

_ É. Sim. Bem. Eu fico muito em casa. Não saio muito. Sabe como é.

_ Namorada?

_ Não.

_ Mas há uns dias tinha uma fotografia de mulher no seu lixo. Até bonitinha.

_ Eu estava limpando umas gavetas. Coisa antiga.

_ Você não rasgou a fotografia. Isso significa que, no fundo, você quer que ela volte.

_ Você já está analizando o meu lixo!

_ Não posso negar que o seu lixo me interessou.

_ Engraçado. Quando examinei o seu lixo, decidi que gostaria de conhecê-la. Acho que foi a poesia.

_ Não! Você viu meus poemas?

_ Vi e gostei muito.

_ Mas são muito ruins!

_ Se você achasse eles ruins mesmo, teria rasgado. eles só estavam dobrados.

_ Se eu soubese que você ia ler...

_ Só não fiquei com eles porque, afinal, estaria roubando. Se bem que, não sei: o lixo da pessoa ainda é propriedade dela?

_ Acho que não. Lixo é domínio público.

_ Você tem razão. Através do lixo, o particular se torna público. O que sobra da nossa vida privada se integra com a sobra da vida dos outros. O lixo é comunitário. É a nossa parte mais social. Será isso?

_ Bom, aí você está indo longe demais no lixo. Acho que...

_ Ontem no seu lixo...

_ O quê?

_ Me enganei, ou éram cascas de camarão?

_ Acertou. Comprei alguns camarões graúdos e descasquei.

_ Eu adoro camarão.

_ Descasquei, mas ainda não comi. Quem sabe a gente pode...

_ Jantar juntos?

_ É.

_ Não quero dar trabalho.

_ Trabalho nenhum.

_ Vai sujar a sua cozinha.

_ Nada. Num instante se limpa tudo e põe os restos fora.

_ No seu lixo ou no meu?




(Extraído de "O Analista de Bagé")